segunda-feira, 5 de julho de 2010

Falando sobre os Deuses


Se você não sente que os deuses são importantes em primeiro lugar,  então é claro que você não sente que você está negligenciando algo importante se você os deixa de lado.  Mas se alguém ler o material essencial do Livro das Sombras Gardneriano, então será óbvio que os Deuses estão do início ao fim nele. Uma das razões porque eu favoreço uma interpretação mais liberal/literal do Juramento de Segredo é precisamente esse tipo de abuso: pessoas afirmando que nós não deveríamos falar sobre os Deuses e/ou sobre a teologia do Livro das Sombras porque isso deveria ser tudo “secreto”.

Por isso a imensa desordem confusa que esse ecletismo agressivo e desenfreado tem criado na religião, onde muitos supostos “wiccanos” são tão profundamente ignorantes da teologia wicana tradicional que se sentem livres para inventar a sua própria, furtando divindades de outras religiões ou até inventando umas novas em folha,  e passando isso tudo para os outros como sendo “Wicca”.  Desse modo nós temos estórias novas informando a respeito das crenças “wiccanas” e práticas que não tem nenhuma relação de todo com a religião que nós conhecemos.

Eu tenho sentido há muito tempo que era devido precisamente à relutância dos ‘Gardnerianos’ e outros wicanos tradicionais para falar sobre a essência das nossas crenças religiosas que tem causado a degeneração teológica da “Wicca”.  Eles sentiam que podiam guardar tudo para eles mesmos, mas eles estavam errados.  A “Wicca” não-iniciatória estava surgindo para se espalhar, de um modo ou de outro;  o mínimo que esses elders Gardnerianos podiam ter feito era esclarecer que os ecléticos entrassem em contato com a teologia primeiro.

Eu apoio totalmente a liberdade da religião.  Mas eu também apoio totalmente a liberdade de pensamento e a liberdade de falar.  O que significa que eu tenho o direito de informar onde as fronteiras da Wica estão, e de apoiar minhas visões com boas razões a partir do âmago do material Gardneriano,  e de dizer que eu não considero um verdadeiro wicano alguém que não honra e/ou cultue a Deusa e o Deus de Chifres.

Eu apoio totalmente o direito de cada pessoa de manter as crenças religiosas e práticas que,  em seu próprio julgamento,  lhes servem melhor.  Mas eu também apoio o meu próprio direito de interpretar a religião Wica e o que eu penso sobre sua essência e características.  Eu me reservo o direito de expressar essas opiniões em público;  e isso implica, naturalmente, que eu tenho o direito de decidir se o que eu penso sobre as práticas religiosas de qualquer um são o que se poderia chamar de “Wicca”,  ou se eu poderia descrevê-las em outros termos.

Eu expresso minhas opiniões e eu apoio essas opiniões com o que eu acredito sejam bons argumentos.  Se alguém os achar convincentes,  ótimo;  se não, esse é um direito deles também.  Eu estou muito ciente dos modos como os Deuses se tem tornado conhecidos.  É por isso que a teologia e a devoção religiosa é o coração e a essência da Wica, na minha visão.

Pessoas (especialmente os cléricos) em qualquer religião são livres para imaginar os Deuses e expressar esses pensamentos.  Isso envolve experiência direta com os Deuses,  interpretação textual,  ‘insights’ obtidos pelo estudo comparativo da religião, etc.  Eu estou comprometida com um processo de interpretação teológica e especulação. Expresso minhas idéias em público. Essas são liberdades básicas que todos possuem.

Uma das mais recentes “inovações” ecléticas na  teologia da  “Wicca”, uma que me aborrece demais é a tendência de tentar jogar a Deusa e o Deus nos papéis impróprios de  “Mãe Terra”  e  “Pai Celeste”  -  alguma coisa emprestada  de   outras religiões pagãs como a grega e a dos nativos americanos.

O Deus de Chifres nunca foi  “pai celeste”  - certamente não para os wicanos originalmente.  Ele é o Deus da morte e renascimento dos animais, florestas, vegetação e da caça  -  todos aspectos da Terra,  não do céu.  Ele é também o Senhor do Submundo  -  dificilmente um deus do céu.  Claro,  Ele é também o sol e (para alguns de nós) trovão, etc.  Mas o sol não é o céu.  E o Antigo Cornífero não é de jeito nenhum um  “deus pai”  -  a não ser como um propagador de sementes.

Apesar de existirem seguramente alguns aspectos de  “mãe terra”  na Deusa da Wica,  Ela é fundamentalmente a Deusa Estrela,  Criadora,  Alma da Natureza,  Ela cujo corpo envolve o universo, etc.  Ela é uma deidade lunar e celestial.
Observe as pinturas da Deusa e do Deus nos livros originais dos Farrar.  Ele está coroado com cornos, vestido de folhas verdes e frutos de carvalho, etc.,  enquanto que Ela está coroada com a Lua,  rodeada de estrelas,  etc.  A iconografia típica wicana.  Ainda,  espantosamente, até mesmo os Farrar encontram-se confusos o suficiente para fornecer a inadequada e infeliz idéia de  “Mãe Terra/Deus Céu”.   Essa certamente é uma noção pagã,  mas dificilmente representativa da teologia wicana.

Mais importante, a noção de “Deusa Terra/Deus Céu”  reverte completamente as posições da Deusa e do Deus na Arte.  Na Wica,  a Deusa é primal – Ela é a Fonte,  e o Deus nasce Dela,  enquanto que a Terra é apenas uma minúscula partícula de poeira no vasto ventre do cosmos;  assim,  se Ela fosse a Terra e Ele fosse o céu,  então Ele teria que ser a grande fonte de onde Ela veio.  Nós teríamos uma Deusa da morte e renascimento ao invés de um Deus da morte e renascimento,  e nós estaríamos seguindo uma religião que decididamente não é Wica.

A outra maior “mudança” que me ofende em alguns  “wiccanos”  atualmente é a tendência entre Diânicos para ignorar e eliminar o Deus de Chifres, ou para tentar torná-Lo gentil,  não agressivo,  não masculino,  não ameaçador e politicamente correto, ao ponto de torná-Lo um eunuco.

Wica sem o Deus de Chifres não é Wica.  Isso pode ser bruxaria, isso pode ser uma religião da Deusa relacionada com a Wica,  mas a importância da religião é definida pela teologia e Wica é fundamentalmente uma religião que honra os gêneros divinos,  Deusa e Deus,  e qualquer discrepância que tentar eliminar um pólo inteiro da polaridade simplesmente não é Wica.

Eu não tenho objeções a uma religião da Deusa,  estabelecido que seus seguidores imaginem alguma coisa com esse nome,  e parem de tentar pretender que isso seja a mesma religião seguida por aqueles que ardentemente cultuam o Grande Deus de Chifres tanto quanto a Deusa.  Ah, e quanto ao método de  “amenização”  por meio do qual o Deus ainda é honrado, mas só até o ponto em que não perpetua os estereótipos de gênero ?  “Wiccanos Bambi”  é como eu os chamo.  Eles querem desonrar o Deus de Chifres.  Por que  não começar apenas como uma outra religião que já tenha um deus com um véu,  melhor do que tentar afeminar a deidade mais masculina que o mundo conheceu ?

O Deus de Chifres é  “agressivamente macho”  -  a perdição das feministas que odeiam os homens em qualquer lugar.  É toda a questão fálica tanto quanto a de ter chifres.  Veja,  chifres são basicamente armas perigosas que os machos possuem (uff !)  -  não apenas uma decoração inofensiva.  Isso pode ser facilmente verificado por qualquer um desejando entrar na floresta e observando veados adultos golpeando seus chifres sobre os machos que tem direitos sobre as fêmeas.  Eu não creio que os animais tiraram suas idéias sobre masculinidade da  “lavagem cerebral patriarcal”.

A característica essencial da teologia wicana é que nós vemos o divino como dividido em aspectos masculino e feminino, Deus e Deusa.  Wica é uma religião da Natureza, então a teologia tradicional implica que as diferenças de gênero são uma parte inata e essencial da própria Natureza, e não meramente convenções  “construídas socialmente”.   (Sim, algumas coisas do gênero são “construídas” – não existe nada na Natureza que dite que as mulheres devam usar saias e maquiagem – mas não em tudo;  também existem profundas diferenças naturais de gênero que aparecem não apenas em humanos, mas também em nossos parentes animais mais próximos.)

Tem havido algumas contribuições muito boas e inovações de alguns wicanos ecléticos – e eu espero que a Wica como uma religião viva não fique estagnada,  mas continue a crescer e evoluir.  Mas essa evolução necessita tomar uma forma consistente com a teologia essencial da Wica,  ou do contrário eles estarão se arriscando a derivar totalmente para outras espécies de animais.

Editado na lista Gardenerians_all
Traduzido Mario Martinez

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